quinta-feira, 29 de setembro de 2011
Realismo
terça-feira, 13 de setembro de 2011
Diário da guerra
O fundamentalismo muçulmano partilha de uma lógica semelha aos bolcheviques: a vanguarda, o partido, é que era tudo, o parlamentarismo e as eleições eram meramente instrumentais. Embora possa circunstancialmente ganhar peso eleitoral, como se viu com a FIS argelina e o Hamas e se pode vir a ver com a Irmandade muçulmana no Egipto, não é esse o seu principal modus operandi, nem o seu objectivo. Como todos os grupos extremistas, vive do fervor religioso e político, militantismo, lógica de grupo pequeno fechado, e de um discurso que pouco tem a ver com a realidade à volta, se entendida globalmente, mas com uma narrativa histórica, religiosa e profética, ancorada em parte da tradição islâmica, mas nem por isso menos autista. A lógica terrorista é semelhante à dos outros grupos terroristas, como a RAF ou as Brigadas Vermelhas. É a do grupúsculo mais interessado na "purificação" dos próximos, - os dirigentes "moderados" muçulmanos são um alvo primordial - e no aniquilamento dos inimigos, do que pela conversão das massas. A grande diferença é a pulsão apocalíptica que os movimentos assentes numa ideia de "luta de classes" ou nacionalistas não têm. A excepção é o nazismo que tinha igualmente uma componente apocalíptica.
Aqui.
XIV
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Foto de Philippe Pache
A minha irmã Vilma odiava-me. Éva dizia a verdade; ardia entre nós uma espécie de ódio ancestral, uma paixão obscura e indefinível, cujo conteúdo se perdera no decurso dos anos. Não se poderia dizer com exactidão porque nos odiávamos — porque eu também a odiava, sem sentir necessidade de aduzir razões ou pretextos —, não se poderia dizer rigorosamente que actos seus me magoaram, ou o que dissemos uma à outra para assim nos dilacerarmos. Ela foi sempre a mais forte, inclusive a odiar. Se lhe tivessem perguntado porque me odiava tão ferozmente, depressa enumerava acusações e razões; mas nada disso explicava tal ódio. Esquecêramos os pretextos. Ficava a paixão, esse sentimento fogoso e denso que inundava com avalanchas de lama todos os domínios humanos, e, quando Vilma morreu, restavam-me paisagens desoladas em vez de ligações familiares.
Sándor Márai in A herança de Eszter, 2006.
sábado, 3 de setembro de 2011
Segredo
Foto de Siro Anton
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Foto de Siro Anton
Não contes do meu
vestido
que tiro pela cabeça
Nem que corro os
cortinados
para uma sombra mais espessa
Deixa que feche o anel
em redor do teu pescoço
Com as minhas longas
pernas
e a sombra do teu poço
Não contes do meu
novelo
nem da roca de fiar
Nem o que faço
com eles
a fim de te ouvir gritar
Maria Teresa Horta in Poesia Reunida, 2009.