domingo, 4 de abril de 2004
Novamente a perspectiva.
Recapitulando:
Temos uma tradição pitagórico-platónica que lança os alicerces teórico-filosóficos para a criação de um sistema linear de representação normativo mas, de algum modo, considera pouco o processo psico-fisiológico da visão humana, nomeadamente em relação à valorização heterogénea do espaço que está subjacente a um processo de visão esferóide, compreendendo a visão periférica.
Logo a seguir, Euclides, aparentemente pouco interessado em sistemas de representação, debruça-se sobre as questões da geometria e da matemática, incluíndo nos seus estudos as questões relativas à Optica. Faz notar, sem propôr soluções ao nível da representação, que a visão humana nada tem a ver com um continuum quantum, com um espaço homogéneo indistinto mas que é efectivamente uma visão esferóide em que objectos iguais a distâncias diferentes não são vistos de acordo com a proporção entre as suas distâncias mas de acordo com a diferença dos ângulos de visão e que a diferença daquelas é sempre superior à destes, provocando assim uma deformação óptica. Durante toda a Antiguidade, estas “deformações ópticas” notadas por Euclides são tidas em conta quer na escultura, quer na arquitectura, como excepções à regra pitagórico-platónica da perspectiva linear.
No Renascimento, Lucca Paccioli e Alberti, entre outros teóricos, retomam a visão pitagórico-platónica, construíndo um sistema normativo de representação perspética linear. Novamente a incapacidade de integração dos preceitos euclidianos sobre a visão faz com que, intencionalmente ou não, haja uma deturpação das traduções e/ou uma simples ocultação/omissão das ideias euclidianas sobre Optica, nomeadamente do Oitavo Teorema. Mas, tal como na Antiguidade, os artistas sentem, na prática, a “presença” de determinadas excepções à regra. Um dos artistas que, pelo rigor intelectual que o rege, mais pressente estes problemas é Leonardo. Com efeito, no seu Trattato della Pittura, Leonardo começa, naturalmente, por fazer a apologia do sistema de Paccioli quando na Terceira Parte – intitulada De’ vari accidenti e movimenti dell’uomo e proporzioni di membra – nota 456 (Della prospettiva lineale) escreve: La prospettiva lineale si estende nell’ufficio delle linee visuali a provare per misura quanto la cosa seconda è minore che la prima, e la terza che la seconda, e cosí di grado in grado insino al fine delle cose vedute. Trovo per esperienza che la cosa seconda, se sarà tanto distante dalla prima quanto la prima è distante dall’occhio tuo, che, benché infra loro sieno di pari grandezza, la seconda sarà minore che la prima; e se la terza cosa sarà di pari grandezza della seconda e prima innanzi ad essa, sarà lontana dalla seconda quanto la seconda dalla prima, sarà di un terzo della grandezza della prima.
No entanto, mais à frente, na Nota 471 (Perché la cosa dipinta, ancoraché essa venga all’occhio per quella medesima grossenza d’angolo che quella che è piú remota di essa, non pare tanto remota quanto quella della remozione naturale), Leonardo faz notar um primeiro problema de relação de escala e proporção: Diciamo: io dipingo sulla parete a b una cosa che abbia a parere distante un miglio, e dipoi io gliene metto allato una che ha la vera distanza di un miglio, le quali due cose sono in modo ordinate, che la parete a c taglia le piramidi com egual grandezza; nientendimeno mai com due occhi parranno di egual distanza.
Como esta, são múltiplas as referências de Leonardo a excepções à regra perspética.
Mas, tal como Leonardo, Kepler sente o problema: A forma esférica dos olhos corresponde à forma esférica da imagem visual, e a avaliação do tamanho é levada a cabo através da comparação de toda a superfície da esfera com a respectiva parte dela (Opera, Vol. 2, pág.167).
Recapitulando:
Temos uma tradição pitagórico-platónica que lança os alicerces teórico-filosóficos para a criação de um sistema linear de representação normativo mas, de algum modo, considera pouco o processo psico-fisiológico da visão humana, nomeadamente em relação à valorização heterogénea do espaço que está subjacente a um processo de visão esferóide, compreendendo a visão periférica.
Logo a seguir, Euclides, aparentemente pouco interessado em sistemas de representação, debruça-se sobre as questões da geometria e da matemática, incluíndo nos seus estudos as questões relativas à Optica. Faz notar, sem propôr soluções ao nível da representação, que a visão humana nada tem a ver com um continuum quantum, com um espaço homogéneo indistinto mas que é efectivamente uma visão esferóide em que objectos iguais a distâncias diferentes não são vistos de acordo com a proporção entre as suas distâncias mas de acordo com a diferença dos ângulos de visão e que a diferença daquelas é sempre superior à destes, provocando assim uma deformação óptica. Durante toda a Antiguidade, estas “deformações ópticas” notadas por Euclides são tidas em conta quer na escultura, quer na arquitectura, como excepções à regra pitagórico-platónica da perspectiva linear.
No Renascimento, Lucca Paccioli e Alberti, entre outros teóricos, retomam a visão pitagórico-platónica, construíndo um sistema normativo de representação perspética linear. Novamente a incapacidade de integração dos preceitos euclidianos sobre a visão faz com que, intencionalmente ou não, haja uma deturpação das traduções e/ou uma simples ocultação/omissão das ideias euclidianas sobre Optica, nomeadamente do Oitavo Teorema. Mas, tal como na Antiguidade, os artistas sentem, na prática, a “presença” de determinadas excepções à regra. Um dos artistas que, pelo rigor intelectual que o rege, mais pressente estes problemas é Leonardo. Com efeito, no seu Trattato della Pittura, Leonardo começa, naturalmente, por fazer a apologia do sistema de Paccioli quando na Terceira Parte – intitulada De’ vari accidenti e movimenti dell’uomo e proporzioni di membra – nota 456 (Della prospettiva lineale) escreve: La prospettiva lineale si estende nell’ufficio delle linee visuali a provare per misura quanto la cosa seconda è minore che la prima, e la terza che la seconda, e cosí di grado in grado insino al fine delle cose vedute. Trovo per esperienza che la cosa seconda, se sarà tanto distante dalla prima quanto la prima è distante dall’occhio tuo, che, benché infra loro sieno di pari grandezza, la seconda sarà minore che la prima; e se la terza cosa sarà di pari grandezza della seconda e prima innanzi ad essa, sarà lontana dalla seconda quanto la seconda dalla prima, sarà di un terzo della grandezza della prima.
No entanto, mais à frente, na Nota 471 (Perché la cosa dipinta, ancoraché essa venga all’occhio per quella medesima grossenza d’angolo che quella che è piú remota di essa, non pare tanto remota quanto quella della remozione naturale), Leonardo faz notar um primeiro problema de relação de escala e proporção: Diciamo: io dipingo sulla parete a b una cosa che abbia a parere distante un miglio, e dipoi io gliene metto allato una che ha la vera distanza di un miglio, le quali due cose sono in modo ordinate, che la parete a c taglia le piramidi com egual grandezza; nientendimeno mai com due occhi parranno di egual distanza.
Como esta, são múltiplas as referências de Leonardo a excepções à regra perspética.
Mas, tal como Leonardo, Kepler sente o problema: A forma esférica dos olhos corresponde à forma esférica da imagem visual, e a avaliação do tamanho é levada a cabo através da comparação de toda a superfície da esfera com a respectiva parte dela (Opera, Vol. 2, pág.167).