quinta-feira, 17 de junho de 2004
Quanto à estrutura das imagens
Na abordagem do fenómeno fotográfico, ocorreu-me fazer a leitura “positivista” que, não sendo, pelo menos em termos teóricos, oposta à abordagem semiológica que Barthes faz em A câmara clara, acaba por tomar um carácter mais clínico mas, ao mesmo tempo, mais esclarecedor e, em alguns aspectos, estimulante.
Os conceitos subjacentes à análise de Barthes, nomeadamente quando determina a existência de dois tipos de imagem fotográfica, são:
a) A imagem dominada pelo studium, ou seja, pela comunicação segura, passível de contradição justamente porque segura, entre o criador e o leitor, numa estrutura não surpreendente de representação do mundo, a que Barthes chama imagem unária – “Na gramática generativa, uma transformação é unária se, através dela, uma única série é produzida pela base; são estas as transformações: passiva, negativa, interrogativa, enfática. A Fotografia é unária quando transforma enfaticamente a «realidade» sem a desdobrar, sem a fazer vacilar (a ênfase é uma força de coesão): nenhum duelo, nenhuma indirecta, nenhum distúrbio.”
b) A imagem “atravessada, chicoteada, raiada” por um punctum. Esse punctum é um objecto particular, um “pormenor”. E, “por muito fulgurante que seja, o punctum possui, mais ou menos virtualmente, uma força de expansão. Essa força é muitas vezes metonímica.”
Paralelamente a estes conceitos, podemos fazer uma desmontagem da imagem enquanto facto. Em Maio de 1922, Bertrand Russell, no notável prefácio ao Tratactus Logico-Philosophicus, escreve a dado passo: “Por forma a que uma determinada afirmação se refira a um determinado facto é necessário que, qualquer que seja a construção da linguagem, exista algo de comum entre a estrutura da afirmação e a estrutura do facto.” E, mais adiante, explicita: “Uma imagem é um modelo da realidade e os objectos da realidade correspondem aos objectos da imagem. O facto das coisas terem, entre si, uma certa relação é representado pelo facto de, numa imagem, os seus elementos terem, entre si, uma certa relação. O que uma imagem tem de ter em comum com a realidade, por forma a representá-la, é a sua forma de representação. Uma imagem pode ou não corresponder a um facto, e ser aferida em termos de verdadeiro ou falso, mas, em qualquer dos casos, partilha a forma lógica com o facto”.
Não deixa de ser curioso pensar o objecto Fotografia no âmbito desta desmontagem.
Ainda os retratos post-mortem
Afirma Barthes a certa altura: “Na Fotografia, a presença da coisa (num determinado momento passado) nunca é metafórica; e, no que respeita aos seres animados, a sua vida também não, salvo se fotografarmos cadáveres. Nesse caso, se a fotografia se torna horrível, é porque certifica, por assim dizer, que o cadáver está vivo, enquanto cadáver: é uma imagem viva de uma coisa morta. Porque a imobilidade da foto é como que o resultado de uma confusão preversa entre dois conceitos: o Real e o Vivo.”
Na abordagem do fenómeno fotográfico, ocorreu-me fazer a leitura “positivista” que, não sendo, pelo menos em termos teóricos, oposta à abordagem semiológica que Barthes faz em A câmara clara, acaba por tomar um carácter mais clínico mas, ao mesmo tempo, mais esclarecedor e, em alguns aspectos, estimulante.
Os conceitos subjacentes à análise de Barthes, nomeadamente quando determina a existência de dois tipos de imagem fotográfica, são:
a) A imagem dominada pelo studium, ou seja, pela comunicação segura, passível de contradição justamente porque segura, entre o criador e o leitor, numa estrutura não surpreendente de representação do mundo, a que Barthes chama imagem unária – “Na gramática generativa, uma transformação é unária se, através dela, uma única série é produzida pela base; são estas as transformações: passiva, negativa, interrogativa, enfática. A Fotografia é unária quando transforma enfaticamente a «realidade» sem a desdobrar, sem a fazer vacilar (a ênfase é uma força de coesão): nenhum duelo, nenhuma indirecta, nenhum distúrbio.”
b) A imagem “atravessada, chicoteada, raiada” por um punctum. Esse punctum é um objecto particular, um “pormenor”. E, “por muito fulgurante que seja, o punctum possui, mais ou menos virtualmente, uma força de expansão. Essa força é muitas vezes metonímica.”
Paralelamente a estes conceitos, podemos fazer uma desmontagem da imagem enquanto facto. Em Maio de 1922, Bertrand Russell, no notável prefácio ao Tratactus Logico-Philosophicus, escreve a dado passo: “Por forma a que uma determinada afirmação se refira a um determinado facto é necessário que, qualquer que seja a construção da linguagem, exista algo de comum entre a estrutura da afirmação e a estrutura do facto.” E, mais adiante, explicita: “Uma imagem é um modelo da realidade e os objectos da realidade correspondem aos objectos da imagem. O facto das coisas terem, entre si, uma certa relação é representado pelo facto de, numa imagem, os seus elementos terem, entre si, uma certa relação. O que uma imagem tem de ter em comum com a realidade, por forma a representá-la, é a sua forma de representação. Uma imagem pode ou não corresponder a um facto, e ser aferida em termos de verdadeiro ou falso, mas, em qualquer dos casos, partilha a forma lógica com o facto”.
Não deixa de ser curioso pensar o objecto Fotografia no âmbito desta desmontagem.
Ainda os retratos post-mortem
Afirma Barthes a certa altura: “Na Fotografia, a presença da coisa (num determinado momento passado) nunca é metafórica; e, no que respeita aos seres animados, a sua vida também não, salvo se fotografarmos cadáveres. Nesse caso, se a fotografia se torna horrível, é porque certifica, por assim dizer, que o cadáver está vivo, enquanto cadáver: é uma imagem viva de uma coisa morta. Porque a imobilidade da foto é como que o resultado de uma confusão preversa entre dois conceitos: o Real e o Vivo.”