terça-feira, 3 de agosto de 2004
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Sandorfi – A aparência é aparição
"L'Otage", 220x150 cm, 1984
A obra de Sandorfi resume-se a uma frase do autor: «a pintura existe unicamente para combater as palavras». Algum sentido isto tem quando nos confrontamos com o impacto paralizante, a luz dramática da sua representação das coisas e do mundo, a denúncia estridente da realidade. Quando olhamos as naturezas mortas, há, no entanto, que perguntar: mas que denuncia esta pintura que se ocupa apenas das coisas mortas em vez da essencial precaridade das matérias vivas?
A pintura de Sandorfi é, afinal, apenas aparência e jogo. Eventualmente, um jogo essencial e metafísico, mas antes de tudo, um jogo. Neste jogo, a relação com o objecto fotográfico é evidente. Mas este jogo joga-se numa relação preversa com o objecto fotográfico: a imagem tem uma aparência lúdica, parece-nos uma cópia ou um simples reflexo, uma mimética pictural do modelo fotográfico. Mas a sua característica de irrealidade advém da exposição permanente de evidências específicas da imagem fotográfica, há uma espécie de tensão nas coisas que normalmente são só reais. A exposição das evidências específicas do material fotográfico, provoca esse quadro dramático e, ao mesmo tempo teatral, como a imitação convencional de um drama. Mitifica-se o cenário, eleva-se os objecto a um nível superior ao das coisas quotidianas.
"Nature morte aux matières inconciliables", 160x190 cm, 1983
Esta pintura manifesta-se também na sua profunda seriedade. Não há aqui nenhum apanágio comercial, nenhuma tentativa de mostrar a realidade essencial das coisas. Ela vive de si mesma, num espaço de solidão e na relação interior com as coisas do mundo.
Nas palavras de Pierre Restany “o artista é literalmente absorvido pelas aparências, a arte é um jogo sem jogador”.
"Homage à Jacqueline", 130x162 cm, 1984