quinta-feira, 5 de agosto de 2004
_______________________________________________
J.L. Borges in Tlön, Uqbar, Orbis Tertius, 1941.
Uma das escolas de Tlön chega a negar o tempo: raciocina que o presente é indefinido, que o futuro não tem realidade senão como esperança presente (Russel - The Analysis of Mind, 1921, página 159 - supõe que o planeta foi criado há poucos minutos, provido de uma humanidade que «recorda» um passado ilusório). Outra escola declara que já decorreu todo o tempo e que a nossa vida é apenas a lembrança ou reflexo crepuscular, e sem dúvida falseado e mutilado, de um processo irrecuperável. Outra, que a história do universo - e nela as nossas vidas e o pormenor mais ténue das nossas vidas - é a escrita que produz um deus subalterno para se entender com um demónio. Outra, que o universo é comparável a essas criptografias em que não valem todos os símbolos e que só é verdade o que sucede de trezentas em trezentas noites. Outra, que enquanto dormimos aqui, estamos acordados noutro lado e que assim cada homem é dois homens.
J.L. Borges in Tlön, Uqbar, Orbis Tertius, 1941.