segunda-feira, 7 de novembro de 2005
Ao filho
Foto de Jan Bengtsson
Não sou eu a gerar-te. Os mortos, sim.
São minha mãe, seu pai e os seus maiores,
São os que um longo dédalo de amores
Traçaram desde Adão, Abel, Caim
A partir dos desertos, numa aurora
Tão antiga, que é já mitologia,
E chegam, sangue e ossos, a este dia
Do futuro, no qual te engendro agora.
Sinto essa multidão. Somos nós todos
E entre nós és tu e os vindouros
Filhos que hás-de gerar. Os derradeiros
E os do vermelho Adão. Sou os herdeiros
Também. A eternidade está nas coisas
Do tempo, que são formas pressurosas.
J. L. Borges in O Outro, o Mesmo, 1964.
Foto de Jan Bengtsson
Não sou eu a gerar-te. Os mortos, sim.
São minha mãe, seu pai e os seus maiores,
São os que um longo dédalo de amores
Traçaram desde Adão, Abel, Caim
A partir dos desertos, numa aurora
Tão antiga, que é já mitologia,
E chegam, sangue e ossos, a este dia
Do futuro, no qual te engendro agora.
Sinto essa multidão. Somos nós todos
E entre nós és tu e os vindouros
Filhos que hás-de gerar. Os derradeiros
E os do vermelho Adão. Sou os herdeiros
Também. A eternidade está nas coisas
Do tempo, que são formas pressurosas.
J. L. Borges in O Outro, o Mesmo, 1964.