sexta-feira, 28 de julho de 2006
Portugal, trespassa-se
O DN dá hoje a notícia. Já ontem tinha havido este anúncio na entrevista à Antena 2. Maria João Pires baixa os braços. O projecto fabuloso de Belgais será abandonado. Anos e anos de más vontades, pequenas invejas, ostracismo e boicote por parte do poder, em particular do poder cultural que, neste país, continua entregue a pequenos feudos que repartem entre si os dinheiros, as influências, as oportunidades, minando tudo aquilo que não controlam e acabando por conseguir, em grande parte dos casos, destruír projectos, minimizando ideias, artistas e carreiras — principalmente aqueles que, como Maria João Pires, se recusam a fazer a vénia aos grupos de influência e têm a coragem de chamar os bois pelos nomes (e, aqui, a expressão é literal).
Tanto se fala dos jogos de poder e de influência nas esferas da política ou da justiça e se esquece a vergonha que, ao longo das últimas décadas, tem sido a vida cultural deste pobre país, entregue a meia dúzia de caciques que se apropriam de todos os meios, de todas as oportunidades, quase sempre com a complacência do poder político.
Quem, como eu, teve a oportunidade de conhecer e modestamente colaborar com Belgais, sabe o que estava ali em jogo. Sabe do fabuloso investimento que foi feito e o espírito de dádiva com que foi feito. Sabe do projecto e do sonho que estava ali presente. Sabe dos ideais estéticos e éticos que o sustentavam. Sabe da imensa humildade e espírito de resignação com que era levado. Sabe o quanto os media nacionais menosprezaram Belgais, ridicularizando-se a si mesmos, fazendo o favor de, anual e displicentemente, divulgar pequenas notícias. Esta desproporção entre o apoio e interesse que Belgais suscitava internacionalmente e o constante silêncio nacional era evidente para quem lá chegava e, invariávelmente, "tropeçava" em equipas da televisão alemã, sueca ou dinamarquesa fazendo documentários e filmes sobre o centro de Belgais ou as visitas e apoio financeiro vindos do Japão, dos pianos Yamaha. A Maria João encarava toda esta pompa e circunstância que internacionalmente o projecto de Belgais suscitava com a simplicidade que a caracteriza e, noites inteiras no club (quem lá esteve sabe do que estou a falar), repetia de forma sempre resignada mas desgostosa o pouco apoio e as canalhices que aqui lhe faziam.
O projecto de Belgais vai para S. Salvador da Baía. Há muitos anos atrás, também foi lá que o projecto universitário de Agostinho da Silva se concretizou. Portugal, trespassa-se. Fica entregue aos caciques.
Tanto se fala dos jogos de poder e de influência nas esferas da política ou da justiça e se esquece a vergonha que, ao longo das últimas décadas, tem sido a vida cultural deste pobre país, entregue a meia dúzia de caciques que se apropriam de todos os meios, de todas as oportunidades, quase sempre com a complacência do poder político.
Quem, como eu, teve a oportunidade de conhecer e modestamente colaborar com Belgais, sabe o que estava ali em jogo. Sabe do fabuloso investimento que foi feito e o espírito de dádiva com que foi feito. Sabe do projecto e do sonho que estava ali presente. Sabe dos ideais estéticos e éticos que o sustentavam. Sabe da imensa humildade e espírito de resignação com que era levado. Sabe o quanto os media nacionais menosprezaram Belgais, ridicularizando-se a si mesmos, fazendo o favor de, anual e displicentemente, divulgar pequenas notícias. Esta desproporção entre o apoio e interesse que Belgais suscitava internacionalmente e o constante silêncio nacional era evidente para quem lá chegava e, invariávelmente, "tropeçava" em equipas da televisão alemã, sueca ou dinamarquesa fazendo documentários e filmes sobre o centro de Belgais ou as visitas e apoio financeiro vindos do Japão, dos pianos Yamaha. A Maria João encarava toda esta pompa e circunstância que internacionalmente o projecto de Belgais suscitava com a simplicidade que a caracteriza e, noites inteiras no club (quem lá esteve sabe do que estou a falar), repetia de forma sempre resignada mas desgostosa o pouco apoio e as canalhices que aqui lhe faziam.
O projecto de Belgais vai para S. Salvador da Baía. Há muitos anos atrás, também foi lá que o projecto universitário de Agostinho da Silva se concretizou. Portugal, trespassa-se. Fica entregue aos caciques.