quarta-feira, 13 de setembro de 2006
Os anjos – I
Foto de Katarzina Widmanska
Eles andam no ar
com as suas vestes
longas
as asas frementes
a baterem no tempo
Vêm
da infância
a rasar a memória
a voarem o vento
Ouvia os insectos,
deitada-rente
sobre a terra
e imaginava os anjos
debruçados no espaço
a beberem o sol
Uma por uma as pétalas
Os gomos
as citilantes escamas
mais pequenas
Uma por uma as penas
a formularem a nossa memória
das asas dos anjos
Tem a força estagnada
das paredes
a respirarem através da cal do útero
num arfar
lento
menstruação contida
Os pés vão nus,
a bordejarem o voo
a controlarem o
espaço
lemes do corpo
a fixarem
as asas:
crespas e acesas
nos ombros dos
anjos
São anjos
apenas
com o corpo dos homens
num corpo de mulher
e um ligeiro crepitar
de asas
na altura dos ombros
Tem uma conotação
sexual
de aventura
com a sua vagina
entreaberta
e o seu clitóris tumefacto
e tenso
à ponta dos dedos
Desviar os lábios
dos anjos
mas entreabrir-lhes também
as coxas
os sonhos – a mente
enquanto eles observam
Quando os anjos
flutuam
sobre as tréguas
naquele segundo
em que se ouve bater
o coração das pedras
Uma flor de
amparo,
o apoio de uma
asa
no voo raso às raízes do tempo
Até ao vácuo?
Os anjos são
os olhos
da cidade
Olhos de mulher,
que voa
Tem asas de cristal
e água
os anjos que à flor-do-dia
entornam a madrugada
cintilantes e volácteis
Eles voam com as suas asas
de prazer:
os anjos da fala
– dormindo na saliva da boca
Substituir os peixes alados
por anjos
Com as suas longínquas asas
a afagar os meus ombros
Queria saber
do destino dos anjos
quando voam
no mar
dos nossos olhos
No céu líquido
dos olhos
das mulheres
Diz-me
da poesia
através da palavra
dos anjos...
Aos olhos do tempo
a transgressão
das horas
pelo dentro das nervuras
das asas
pequenos capilares de vento
onde começa a vontade
de voar
num caminhar
sedento
Têm todos os anjos
o vício:
da queda?
Maria Tereza Horta
Foto de Katarzina Widmanska
Eles andam no ar
com as suas vestes
longas
as asas frementes
a baterem no tempo
Vêm
da infância
a rasar a memória
a voarem o vento
Ouvia os insectos,
deitada-rente
sobre a terra
e imaginava os anjos
debruçados no espaço
a beberem o sol
Uma por uma as pétalas
Os gomos
as citilantes escamas
mais pequenas
Uma por uma as penas
a formularem a nossa memória
das asas dos anjos
Tem a força estagnada
das paredes
a respirarem através da cal do útero
num arfar
lento
menstruação contida
Os pés vão nus,
a bordejarem o voo
a controlarem o
espaço
lemes do corpo
a fixarem
as asas:
crespas e acesas
nos ombros dos
anjos
São anjos
apenas
com o corpo dos homens
num corpo de mulher
e um ligeiro crepitar
de asas
na altura dos ombros
Tem uma conotação
sexual
de aventura
com a sua vagina
entreaberta
e o seu clitóris tumefacto
e tenso
à ponta dos dedos
Desviar os lábios
dos anjos
mas entreabrir-lhes também
as coxas
os sonhos – a mente
enquanto eles observam
Quando os anjos
flutuam
sobre as tréguas
naquele segundo
em que se ouve bater
o coração das pedras
Uma flor de
amparo,
o apoio de uma
asa
no voo raso às raízes do tempo
Até ao vácuo?
Os anjos são
os olhos
da cidade
Olhos de mulher,
que voa
Tem asas de cristal
e água
os anjos que à flor-do-dia
entornam a madrugada
cintilantes e volácteis
Eles voam com as suas asas
de prazer:
os anjos da fala
– dormindo na saliva da boca
Substituir os peixes alados
por anjos
Com as suas longínquas asas
a afagar os meus ombros
Queria saber
do destino dos anjos
quando voam
no mar
dos nossos olhos
No céu líquido
dos olhos
das mulheres
Diz-me
da poesia
através da palavra
dos anjos...
Aos olhos do tempo
a transgressão
das horas
pelo dentro das nervuras
das asas
pequenos capilares de vento
onde começa a vontade
de voar
num caminhar
sedento
Têm todos os anjos
o vício:
da queda?
Maria Tereza Horta