segunda-feira, 4 de dezembro de 2006
Ao canto do ar
Foto de Katarzina Widmanska
Braços carnudos e peles confundem-se na espessura da atmosfera. Quem canta lá fora?
As luzes seguem o vapor emanado pelos corpos ligeiros, pelos espíritos graves. A terra fria está diante da porta.
E todos os mendigos batiam ao mesmo tempo ao postigo fechado, ao portão imponente. O regato, gemendo, precipita-se na rua.
Um espectáculo igual os espera: a noite vai surpreendê-los; talvez perante a morte o fulgor da razão os ilumine.
Finalmente, a música toca, apesar de tudo, um motivo qualquer. A alegria ainda existe neste mundo onde tanto a desejam, onde tanto esperam por ela. Veremos.
A passo as mulheres desfilaram em direcção aos carros fechados. Nessa noite os boulevards estavam desertos, o céu lívido: chovera tanto!
Os homens, ao passarem, tinham desbaratado tudo. Com altos gritos, aquele que não tivesse podido fugir era morto ou preso. Restava só a esperança de voltar.
E também esta esperança se perdeu quando se apagaram as luzes.
(1918)
Pierre Reverdy
Braços carnudos e peles confundem-se na espessura da atmosfera. Quem canta lá fora?
As luzes seguem o vapor emanado pelos corpos ligeiros, pelos espíritos graves. A terra fria está diante da porta.
E todos os mendigos batiam ao mesmo tempo ao postigo fechado, ao portão imponente. O regato, gemendo, precipita-se na rua.
Um espectáculo igual os espera: a noite vai surpreendê-los; talvez perante a morte o fulgor da razão os ilumine.
Finalmente, a música toca, apesar de tudo, um motivo qualquer. A alegria ainda existe neste mundo onde tanto a desejam, onde tanto esperam por ela. Veremos.
A passo as mulheres desfilaram em direcção aos carros fechados. Nessa noite os boulevards estavam desertos, o céu lívido: chovera tanto!
Os homens, ao passarem, tinham desbaratado tudo. Com altos gritos, aquele que não tivesse podido fugir era morto ou preso. Restava só a esperança de voltar.
E também esta esperança se perdeu quando se apagaram as luzes.
(1918)
Pierre Reverdy