terça-feira, 31 de agosto de 2004
Combatente, 1855.
A Guerra da Crimeia esteve na origem da ascensão ao trono do Czar Nicolau I em 1825. Em 1852, afirmando a sua vontade de desmantelar o Império Otomano, e prevendo a queda de Constantinopla, envia tropas para a invasão das províncias semi-autónomas da Moldavia. Em 23 de Outubro de 1853, o Império Otomano declara guerra à Rússia. Cinco meses mais tarde, a França e a Inglaterra aliam-se aos turcos. A primeira fase da guerra situa-se nas províncias romenas. Mas, rápidamente, as hostilidades concentram-se na Crimeia, à volta de Sebastopol, defendida pelos russos. O cerco à cidade começa em Março de 1854.
Na sequência do impacto negativo que a guerra tem na opinião pública inglesa, manipulada pelo Times, a raínha Victoria envia para a Crimeia o repórter fotográfico Roger Fenton para cobrir o conflito. Fenton opta por uma amostragem da diversidade étnica das forças aliadas e por uma visão calma e falsamente pacífica da guerra.
Combatentes do Montenegro, 1855.
O cerco de Sebastopol dura três meses de intensos combates. Sebastopol cai a 8 de Setembro de 1855. Fenton abandona a Crimeia antes da queda de Sebastopol. Um outro fotógrafo, James Robertson, entra naquilo que resta da cidade depois de um cerco de 340 dias. O último bastião - a torre Malakoff - é o lugar que escolhe para fotografar Sebastopol devastada.
Por sua vez, Napoleão III envia para a Crimeia Jean-Charles Langlois, militar de carreira e pintor. A partir de um conjunto de fotografias de Sebastopol tiradas da torre Malakoff formando uma imagem única panorâmica de 360 graus, Langlois pinta Panorama de Sebastopol num edifício circular construído para esse fim pelo arquitecto Gabriel Davioud no rond-point dos Champs-Élysées e que inaugura em 1860. Nada resta dessas pinturas. Hoje o edifício é o teatro do Rond-Point.
Sebastopol, vista da torre Malakoff, 1855.
A guerra aqui ainda não tem o carácter pornográfico dos nossos dias com a permanente exposição dos corpos e das partes. A visão de Fenton e de Robertson é ainda uma visão romântica.
Sebastopol, vista da torre Malakoff, 1855.
segunda-feira, 30 de agosto de 2004
Ainda que pareça estranho, o acontecimento colhe desprevenidos os habitantes de Pompeia. Eles sabiam que viviam numa zona sísmica: 17 anos antes, em 62 d. C., um forte terramoto tinha provocado o desabamento e danificado muitos edifícios que estavam ainda ou fechados ou a ser restaurados. Nos anos subsequentes outros tremores de terra teriam provavelmente ocorrido na zona, provocando outros danos que tais como os de 62 eram ainda visíveis no momento da erupção. Nesta data de facto a colunata da Basílica continuava por terra e dos edifícios termais só estava aberto ao público a secção masculina das termas do Foro; dos três edifícios dedicados a espectáculos só o anfiteatro, a Palestra Grande, estava em via de restauro. Os terramotos, em suma, eram uma calamidade anunciada.
Mas a erupção do Vesúvio não era esperada por ninguém, pois a última erupção tinha tido lugar antes de Pompeia ter começado a existir, no séc. VII a. C.
Quando o longo sono do vulcão terminou naquele dia 24 de Agosto, a explosão foi espectacular, como se verifica quer através da análise dos materiais lançados pelo vulcão quer pela leitura de dois documentos absolutamente extraordinários, as duas cartas de Plínio, o Jovem, que descrevem as diferentes fases da erupção.
Quando a erupção começou, ele encontrava-se na Campânia com o seu célebre tio Plínio, o Velho, comandante da frota que estava em Miseno. Plínio o Velho perdeu a vida durante a erupção e o historiador Tácito — que tencionava relatar a morte duma tão ilustre personagem — pede ao sobrinho para lhe descrever com exactidão os acontecimentos. E Plínio, o Jovem, responde com a famosa Epístola VI, 16.
“Eram cerca das 13:00 horas do dia 24 de Agosto quando a minha mãe mostrou a Plínio (o Velho) uma nuvem estranha quer pelo tamanho quer pela forma... Calçando as sandálias, ele sai procurando um sítio alto de onde se possa observar melhor o fenómeno. De um monte difícil de identificar, dada a distância (soube depois que era o Vesúvio) elevava-se uma nuvem cuja forma só pode ser bem descrita se comparada com um pinheiro. Com um fortíssimo tronco ramificava-se no alto, creio que com o formato de uma poderosa âncora, que se dividia ainda, e depois desvanecendo-se esta força ou forças, a nuvem alargava-se ora limpa, ora suja e manchada segundo a quantidade de cinza ou terra que tinha erguido no ar.”
Como bom naturalista, Plínio, o Velho decidiu embarcar para poder observar o fenómeno de mais perto. Mas como o sobrinho tem o cuidado de dar a conhecer, a sua atitude foi também um nobre gesto de amizade: a mulher de um amigo seu, bloqueada na sua casa de campo na encosta do monte tinha mandado uma mensagem a pedir-lhe ajuda. A situação era grave: “Já sobre os navios caíam cinzas, cada vez mais quentes e densas à medida que se iam aproximando da zona e caíam mesmo pedras ardentes ou incendiadas.” Plínio desembarcou no litoral estabiano (de Stabia) enquanto “no monte Vesúvio em vários pontos brilhavam vastíssimas chamas e altas línguas de fogo, cujo brilho se tornava ainda mais forte na escuridão da noite.” Depois de ter tentado convencer os amigos de que se tratava de fogos feitos pelos proprietários rurais, Plínio foi deitar-se, aparentemente tranquilo. Mas quando se levantou “o quintal para o qual dava o quarto tinha-se enchido de cinza e lapili a tal ponto que se tivesse permanecido mais uns minutos não teria conseguido sair.” Além disso “com os frequentes e fortes abalos telúricos a casa tremia e como liberta dos alicerces parecia andar de um lado para o outro: na aflição temia-se a chuva de lapili ligeiro e corrosivo que não cessava.”
Esperando proteger-se do lapili com capas sobre a cabeça, Plínio e os amigos saíram e embora fosse dia tinha caído uma escuridão muito negra e densa. É a madrugada de 25 de Agosto e Plínio tenta juntar-se à armada para ver se era possível fazerem-se ao mar, mas as águas estavam muito agitadas para o permitirem. Era o fim: “deitou-se sobre um lençol esticado no chão pediu duas vezes água fria e bebeu dum trago... Apoiando-se em dois escravos tentou levantar-se, mas, de repente, caiu, creio porque tinha a garganta bloqueada pelo ar cheio de densa cinza e não podia respirar. Quando voltou o dia, o seu corpo foi transportado ileso e íntegro, vestido como estava e mais com o aspecto de alguém que dorme do que de um morto.”
Recebida esta primeira carta, Tácito pede outra informação: queria saber o que se tinha passado em Miseno, onde Plínio, o Jovem tinha ficado. A resposta de Plínio descreve a sua aventura até à salvação e fornece outras informações importantes sobre a catástrofe (Epístola VI, 20).
“Já há alguns dias a terra tremia, mas como estávamos na Campânia o fenómeno era comum e a preocupação não era excessiva. Naquela noite porém tremia de tal modo que tínhamos a sensação de que as coisas não se moviam apenas mas que iriam desabar.” Quando a situação se tornou insustentável o Jovem Plínio (era a manhã de 25 de Agosto, e o seu tio estava a morrer ou tinha já morrido) decide deixar a cidade com a sua mãe: “ uma multidão atónita segue-os ... os carros que muitos levavam ainda que estivessem em locais perfeitamente planos moviam-se e não conseguiam estar parados. Enquanto este tremor de terra decorria, o mar afastava-se e deixava sobre as praias muitos animais marinhos. Do lado da terra uma nuvem negra e aterradora, rasgada de relâmpagos sinuosos e acampanhada de vapores escaldantes lançava-se sobre nós em longas com grandes chamas semelhantes a fogueiras mas enormes.” Plínio então agarra a mãe pela mão e incita-a a apear-se do carro tentando a fuga a pé.” Caíam cinzas mas naquele momento eram ainda pouco densas. Olhei para trás. Uma nuvem densíssima aproximava-se.” A noite caiu de novo. ”Ouviam-se gemidos de mulheres, choro e gritos de crianças, gritos de homens que chamavam em altos brados os pais ou os filhos ou os esposos para se reconhecerem pela voz. Muitos havia que com medo da morte pediam para morrer. Muitos erguiam as mãos aos deuses, outros diziam que não havia deuses e que aquela era a última e eterna noite do mundo.” Depois finalmente a chuva de cinza começou a rarear, a ver-se a espaços a luz do sol que brilhava pálido como se fosse um eclipse: “tudo aparecia mudado e coberto de um espesso estrato de cinza.”
Documento impressionante e cientificamente relevante, esta descrição de Plínio, o Jovem, passou a ser utilizada pelos vulcanólogos para compreender as várias fases da erupção, juntamente com a análise do restante material vulcânico.
Na 1ª carta descreve Plínio o “pinheiro” vulcânico e é identificada com a fase eruptiva que os vulcanólogos chamam de “pliniana” caracterizada pela emissão de um jacto de cinza e gás que se ergue no ar formando uma enorme coluna magmática. Esta coluna tomba no chão sob a forma de pedra pomes como o confirma Plínio e a sequência de estratos encontrados em Pompeia. O tamanho das pedras vai aumentando com o avanço da erupção. Isto significa que a energia vai aumentando com o tempo e a coluna aumenta em força de expulsão e em tamanho. Como o vento soprava naquele momento para sudeste, a coluna cai sobretudo sobre as encostas oriental e meridional do Vesúvio e atinge Pompeia. Esta fase durou cerca de doze horas e depois as condições da erupção mudaram drasticamente.
Na segunda carta Plínio testemunha outros fenómenos incríveis como o “ mar que se afasta” — isto precede a fase mais desastrosa da erupção —, o cair das cinzas que obscurece a luz do dia, fenómenbos típicos da última fase do fenómeno eruptivo. Quando a erupção parecia abrandar porque a pressão do gás tinha diminuído criaram-se violentos jactos de vapor alimentados pela água do mar que tinha entrado na câmara magmática. Os vapores espalhando-se com a velocidade de um furacão destruíram tudo o que se encontrava no caminho. São estes os terríveis surgex, fluxos de vapor escaldante e cheios de cinza que asfixiaram Plínio, o Velho e com ele muitos pompeanos que teimosamente permaneceram nas suas casas ou que tinham regressado no momento em que a erupção parecia acalmar-se para recuperar os bens que tinham deixado em suas casas ou para roubar as casas dos ricos. Outros foram vítimas do desabamento dos telhados das casas sob o peso do lapili. É difícil fazer uma estimativa de mortos. Talvez um milhar numa população de cerca de dez mil habitantes.
domingo, 22 de agosto de 2004
terça-feira, 17 de agosto de 2004
Correio da Cassini
Cassini continues to uncover new wonders within the Saturn system with its discovery of two new moons orbiting between Mimas and Enceladus. This movie shows the tiny "worldlet," temporarily dubbed S/2004 S2, as it makes its way around the planet. A white box frames the moon's location in the image. The image is part of a sequence specifically designed to search for new moons in the inner saturnian system. The image has not been cleaned of imaging artifacts but has been greatly enhanced in contrast to increase visibility. Consequently, the background scattered light from the nearby rings, as well as many cosmic ray hits and noise patterns, are clearly apparent. The size of S/2004 S2 is estimated to be 4 kilometers (about 2.5 miles) across. Because the moon is small and not resolved it appears as a faint point of light just barely visible above the background.
quarta-feira, 11 de agosto de 2004
terça-feira, 10 de agosto de 2004
Para a discussão artificial/natural (Rui Tavares)
segunda-feira, 9 de agosto de 2004
R. Rorty in A Filosofia e o Espelho da Natureza, Cap. II, Pessoas sem mentes, 1979.
Contingência e Realidade
sexta-feira, 6 de agosto de 2004
Correio da Cassini
Alechinsky
"Dessiner, c'est s'interroger"
Pierre Alechinsky.
Até 27 de Setembro, 250 desenhos de Alechinsky no Centro Pompidou.
Correio da Cassini
Sons. A sério. Os anéis de Saturno.
Sons. A sério. Vento solar colide com o campo magnético de Saturno.
quinta-feira, 5 de agosto de 2004
MY-muss
A Cassini, afastando-se de Saturno, mergulha no mais puro e profundo negro. O invisível e o indizível são aqui sinónimos.
J.L. Borges in Tlön, Uqbar, Orbis Tertius, 1941.
J.L. Borges in Tlön, Uqbar, Orbis Tertius, 1941.
J.L. Borges in História da Eternidade, 1936.
quarta-feira, 4 de agosto de 2004
No Pólo Sul de Saturno.
terça-feira, 3 de agosto de 2004
Jacek Malczewski, «Paysage avec Tobie», 1904
Sandorfi – A aparência é aparição
"L'Otage", 220x150 cm, 1984
A obra de Sandorfi resume-se a uma frase do autor: «a pintura existe unicamente para combater as palavras». Algum sentido isto tem quando nos confrontamos com o impacto paralizante, a luz dramática da sua representação das coisas e do mundo, a denúncia estridente da realidade. Quando olhamos as naturezas mortas, há, no entanto, que perguntar: mas que denuncia esta pintura que se ocupa apenas das coisas mortas em vez da essencial precaridade das matérias vivas?
A pintura de Sandorfi é, afinal, apenas aparência e jogo. Eventualmente, um jogo essencial e metafísico, mas antes de tudo, um jogo. Neste jogo, a relação com o objecto fotográfico é evidente. Mas este jogo joga-se numa relação preversa com o objecto fotográfico: a imagem tem uma aparência lúdica, parece-nos uma cópia ou um simples reflexo, uma mimética pictural do modelo fotográfico. Mas a sua característica de irrealidade advém da exposição permanente de evidências específicas da imagem fotográfica, há uma espécie de tensão nas coisas que normalmente são só reais. A exposição das evidências específicas do material fotográfico, provoca esse quadro dramático e, ao mesmo tempo teatral, como a imitação convencional de um drama. Mitifica-se o cenário, eleva-se os objecto a um nível superior ao das coisas quotidianas.
"Nature morte aux matières inconciliables", 160x190 cm, 1983
Esta pintura manifesta-se também na sua profunda seriedade. Não há aqui nenhum apanágio comercial, nenhuma tentativa de mostrar a realidade essencial das coisas. Ela vive de si mesma, num espaço de solidão e na relação interior com as coisas do mundo.
Nas palavras de Pierre Restany “o artista é literalmente absorvido pelas aparências, a arte é um jogo sem jogador”.
"Homage à Jacqueline", 130x162 cm, 1984